terça-feira, fevereiro 03, 2004

Como ando meio sem inspiração para escrever vou transformar a resposta a um comentário em um post, até porque a resposta ficou meio grande. O comentário é do nosso colega Vladmir, no post sobre a agressão, pelos sem-terra, de um pai que tentava levar o filho ao hospital, que me cobra a mesma "indignação" em duas situações diferentes.

Primeiro no caso em que "jagunços a mando de donos de terra assassinaram os delegados do ministério do trabalho em Unaí" (palavras dele). Antes de qualquer coisa eu gostaria de entender com base em que ele fez essa afirmação. Como ele sabe disso? Só consigo imaginar duas hipóteses: A primeira que ele estava lá, e supondo que - como foi noticiado - não houve testemunhas, no local e hora do crime só haviam assassinos e assassinados, para ele estar escrevendo um comentário aqui ele deve ser um dos assassinos. A segunda é que ele é onisciente, e portanto, Deus. O que tenho uma certa relutância em acreditar.

A polícia está trabalhando com a hipótese de latrocínio, até porque um dos assassinados conseguiu dirigir por alguns quilômetros e relatar que foi anunciado o assalto, antes de morrer. É claro que a hipótese de "execução" não pode ser descartada, e até acredito que tenha grande chance de se provar verdadeira, mas antes de concluída a investigação - e quem sabe depois - a única maneira que vejo de se fazer uma afirmação dessas é se enquadrando em uma das duas hipóteses que coloquei anteriormente, e a primeira hipótese ainda fica meio em duvida, já que se provado que foi realmente uma execução, até mesmo uma pessoa que estava lá - um dos assassinados - não sabia.

Mas eu suspeito que se perguntar ao nosso colega como ele sabe, a resposta vai ser algo como "Está na cara, todo mundo sabe". É interessante como o senso comum é utilizado para justificar o próprio senso comum. A realidade? Quem se importa com esse instrumento de dominação burguesa...

Também é interessante nesse caso notar que ele sempre vem acompanhado da expressão "trabalho escravo". Pelo menos no dia do crime, a versão do Ministério do Trabalho era que os fiscais estavam investigando contratações temporárias de trabalhadores durante a época de colheita do feijão se não me engano, que muitas vezes eram feitas "irregularmente", ou seja, sem pagar os encargos trabalhistas. Claro que isso não causa "indignação", se assim dito, já que todo mundo sabe que se for para seguir à risca a aberração que é a legislação trabalhista brasileira acabam todos desempregados. Falar "trabalho escravo" causa muito mais impacto, com a vantagem de se poder colocar logo em seguida uma reportagem sobre investigações de "trabalho escravo" em fazendas de algum político da oposição...

A segunda cobrança é de "2000 trabalhadores rurais sem terra [que] foram asassinados, sem contar os sindicalistas rurais, os repórteres que investigam alguma coisa, o pessoal da CPT, e militantes envolvidos na questão agrária". Não posso falar muito desse numero tirado da cartola (se você citar a CPT como fonte eu paro por aqui...). Não acredito no número, pela simples falta de fonte, mas mesmo que houvesse uma fonte eu duvidaria que todos eles foram "assassinatos", pelo menos até que, de alguma maneira se conseguisse provar, caso a caso, isso e por fim eu duvidaria que todos têm alguma relação com fazendeiros, até que ficasse provado o contrario, caso a caso obviamente.

Mas mesmo que tudo isso se provasse verdade, têm que ser descontados os casos em que as mortes foram de invasores e aconteceram dentro das propriedades dos fazendeiros, que têm, ou pelo menos deveriam ter, o direito de defender a sua propriedade.

Nos casos restantes, em que os assassinatos foram fruto do puro sadismo e sede de sangue burguesa dos latifundiários, se você me mostrar a imagem do assassinato acontecendo eu ficarei indignado sim. Só ouvindo você falar fica difícil, infelizmente me acostumei a não acreditar em tudo que ouço.

No proprio caso do espancamento do pobre pai, se eu fosse acreditar no que estava sendo falado ao invés de acreditar no que estava vendo, acreditaria que ele "tentou furar o bloqueio", coisa que a imagem que estava sendo mostrada naquele exato momento - do pai sendo espancado, a pé - desmentia, e nem precisaria desmentir, basta perceber que se a intenção fosse furar o bloqueio ele não desceria do carro para tentar convencer os baderneiros a deixa-los passar. Furar o bloqueio seria uma atitude louvavel, apesar de na maioria das vezes não ser muito inteligente, principalmente quando lidando com baderneiros que não tem nada a perder, mas nem isso ele tentou e ainda assim tentaram colocar a culpa nele por ter sido espancado.

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